Entrevista sobre FCB
ao Canal da Lu Evans
202208241630P4
– 23.692 D.V.
“Minha casa está parecendo um apartamento ucraniano. É como se tivesse explodido uma bomba lá dentro.”
“Até que você fica mais bonito como Carla.”
[Marcelo Oliveira]
Ontem à tarde,
por volta das 18h00, fui surpreendido por um zap da amiga Ana Lúcia Merege em que
ela avisava à galera sobre uma live em que eu entraria no ar ontem à
noite no canal de YouTube da autora e antologista Lu Evans. Senti um arrepio de pânico. Pois, ao que me constava, a data combinada
para a entrevista referida seria na próxima sexta-feira, dia 26.
Entrei em
contato com a Lu via Messenger do Facebook e ela confirmou:
— É hoje
mesmo, daqui a menos de duas horas.
Corri até nossa
troca de mensagens anterior e verifiquei que ela estava correta. Corretíssima!
Minha entrevista foi marcada para ontem à noite e eu agendei o
compromisso errado no calendário do smartphone.
Alegre e pimpão, julgava ainda ter três dias inteirinhos a fim de me preparar
para o evento.
Enfim, o lado
bom foi que eu não tinha qualquer compromisso inadiável e pude me preparar às
pressas para entrar no ar. Após uma barba-relâmpago,
passei a mão no fone de ouvido e em tudo o que publiquei e que estivesse disponível
aqui na casa da minha mãe, pois Lu havia combinado que eu poderia mostrá-los. Preparar uma apresentação em PowerPoint? Nem pensar.
Quanto muito, consegui postar o link do evento em meia dúzia de grupos
do WhatsApp e no grupo da editora Histórias Incompletas no Telegram. Também anunciei no Facebook e reinicializei
meu micro, just in case.
Enfim, às 19h50
me conectei pelo link que a Lu havia enviado previamente pelo Messenger e lhe
pedi mil desculpas pela confusão. Percebi
que ela se sentiu aliviada (e algo incrédula) por eu ter logrado comparecer a
tempo de participar da entrevista.
Apesar da correria
e do estresse, tudo acabou correndo bem.
Às 20h00 em ponto a entrevista foi ao ar e sua versão youtúbica já se
encontra disponível.[1]
Claro que já não
tenho tanto cabelo escuro quanto nessa foto antiga...😊
Chamada para a entrevista sobre Ficção Científica Brasileira no canal da Lu Evans.
* * *
Já em nossas
primeiras palavras no ar, antes mesmo da minha apresentação, comentamos a confusão
de horários que cometi.
Em verdade,
essa entrevista é parte de um trabalho que Lu Evans tem feito em seu canal,
convidando vários dos autores brasileiros que participarão da antologia Fator
Morus, que ela organiza pelo selo Nebula.
Esta semana fui a bola da vez. Essa
é a segunda antologia organizada por Lu de que participo. A anterior foi Não Existem Humanos
Inteligentes (Nebula, 2021), na qual publiquei o conto escrito
especialmente para a missão: “Macacos Nus”.[2]
Um ponto
muito positivo em participar dessa live com a Lu foi sua atitude extremamente
profissional de me enviar previamente um roteiro detalhado dos tópicos que deveríamos
abordar. Infelizmente, não tive tempo de
relê-lo, uma vez que me equivoquei, julgando que a entrevista só se daria na sexta-feira.
A primeira
pergunta da Lu foi sobre como comecei a escrever. Respondi que, como sempre gostei de contar histórias,
assim que me alfabetizaram comecei a registrar minhas aventuras infantis sob a
forma de protocrônicas pessoais. Até hoje
registro em crônicas os fatos e acontecimentos marcantes da minha vida. Em seguida, confessei que só me iniciei na ficção
vários anos mais tarde, por volta dos treze anos. A partir de uma pergunta feita por Saulo Adami,
presente em nossa pequena, mas participativa, plateia virtual no YouTube, esclareci
que comecei a escrever contos e não novelas ou romances, porque era o que se
conseguia publicar nos fanzines na década de 1980. Contos de ficção científica, pois esse era, sempre
foi e será meu gênero literário favorito.
Em seguida,
abordamos a paixão pelos livros, impressos e digitais, bem como a falsa dicotomia
ou o falso dilema entre mídias físicas e digitais. Esse tema de nossas paixões literárias ressurgiria
diversas vezes ao longo da entrevista.
Aos dezesseis
minutos (a live durou pouco mais de setenta minutos), Lu pediu que eu
falasse e mostrasse meus livros. No
quesito antologias, limitei-me a mostrar a de contos eróticos fantásticos Como
Era Gostosa a Minha Alienígena! (Ano-Luz, 2002), pois foi a única que consegui
achar assim, de bate-pronto, aqui na casa da minha mãe. Daí, passei às coletâneas de ficção curta,
mostrando a Taikodom: Crônicas (Devir, 2009), com narrativas (inclusive
duas novelas) ambientadas no universo ficcional homônimo, que criei para a
Hoplon Infotainment; e a Histórias de Ficção Científica por Carla Cristina Pereira
(Draco, 2012), na qual consegui reunir as narrativas originalmente escrita sob
meu pseudônimo feminino “Carla Pereira”.[3] Então, falei e exibi as capas dos romances
que publiquei pela Draco, A Guardiã da Memória (2011); Aventuras do
Vampiro de Palmares (2014); Estranhos no Paraíso (2015); e Octopusgarden
(2017)[4]. Enfim, falei de meus dois livros de não-ficção:
Vita Vinum Est!: História do Vinho no Mundo Romano (MauadX, 2016); e Cenários
de História Alternativa (Amazon, 2019).
Lu elogiou bastante a bela capa psicodélica feita por Erick Cardoso para
o Octopusgarden. Quando ela falou
que compraria esse romance, aproveitei o ensejo para explicar que ele se passa
no mesmo U.F. Tramas de Ahapooka
de A Guardiã da Memória e funciona como uma espécie de “prequela” do
mesmo. Afinal, a pré-adolescente Clara,
que só aparece em “A Filha do Predador”, espécie de faixa-bônus presente no fim
do Octopusgarden, ao se tornar adulta vira narradora e protagonista de A
Guardiã da Memória.
Enquanto isso,
na plateia virtual do YouTube, meus parceiros na Onde Não Mais, Thayane
Dantas e Marcelo Oliveira estabeleciam uma tabelinha profícua e salutar com o
intuito de reclamar que não eu explico direito meus enredos.😊
* *
*
A pedido da anfitriã,
falei mais uma vez sobre minhas motivações para criar aquela que talvez tenha
sido a personagem mais convincente da minha carreira: Carla Cristina Pereira
(1995-2009). Revelei ter obtido a inspiração
inicial para a criação da Carla num ensaio que li sobre a autora
norte-americana Alice Sheldon, mais conhecida por seu pseudônimo masculino “James
Tiptree, Jr.”[5]. Em realidade, a motivação principal para a existência
da Carla foi escoar minha produção de ficção curta no fim da última década do
século passado, sobretudo, nas antologias da Ano-Luz e da associação portuguesa
de FC&F, a Simetria. Da plateia, o
amigo Gílson Cunha comentou que “pseudônimos são um bom meio de escrever
livremente sem precisar morar num bunker”. Mencionei que, enquanto viva, Carla foi
agraciada com mais prêmios literários do que eu. Contudo, não foi por despeito que resolvi exterminá-la,
mas sim por conta do vil metal: assumi que fui ela quando precisei assinar um
contrato de publicação de um romance curto que, em tese, ela teria escrito.[6]
Em seguida, Lu
pediu que eu falasse um pouco sobre o subgênero da história alternativa.
Capa da coletânea da “Carla”. Reparem quem aparece de ponta-cabeça!
* *
*
Comecei pela
pergunta do Saulo Adami sobre as origens da história alternativa.
A título de
preâmbulo, conceituei brevemente a narrativa de H.A. dentro do âmbito da ficção
científica, procurando distinguir as vertentes ficcional (histórias alternativas
propriamente ditas) da não ficcional (ucronias ou histórias contrafactuais). Falei que a origem das contrafactuais talvez
esteja na própria História de Roma, de Tito Lívio, ao passo que a origem
ficcional se deu com a publicação em francês em 1836 do romance The Napoleon
Apocryphal – duas obras que destrincho pormenorizadamente em meu Cenários
de História Alternativa.😉
Ainda no âmbito
da história alternativa, delineei um romance curto, Xochiquetzal: uma
Princesa Asteca entre os Incas (Draco, 2009), cuja capa não pude mostrar,
pois não o encontrei aqui na casa da minha mãe.
Frisei que as primeiras narrativas dentro dessa linha histórica alternativa
foram publicadas sob o pseudônimo de Carla Pereira.
Em seguida, Lu
me pediu dicas para escrever dentro desse subgênero. Aproveitei para pincelar os conceitos de
ponto de divergência, LHA, passados alternativos e presentes alternativos. Também comentei brevemente sobre os
pecadilhos, armadilhas e falácias que devem ser evitados por autores que almejam
se aventurar no subgênero.
Durante esse
trecho da entrevista, em que falamos sobre histórias alternativas, Saulo Adami
declarou da plateia que essa foi uma das melhores entrevistas que ele assistiu
e não apenas no canal da Lu Evans. Minha
mãe depois comentaria que eu ruborizava sempre que recebia um elogio. Mãe é mãe, né?😊
Ao ser
questionado pelo Gílson Cunha sobre qual seria meu romance de história alternativa
favorito, saquei da manga o magnífico The Guns of the South (1992) do Harry
Turtledove, salientando, entretanto, que se perguntado daqui a uma semana ou um
mês, a resposta talvez fosse diferente, dada a quantidade imensa de narrativas
excelentes dentro do subgênero.
* *
*
Mudando de
assunto, Lu pediu que eu comentasse sobre o conto “Macacos Nus”, publicado na Não
Existem Humanos Inteligentes. Relatei
que a maioria dos personagens dessa ficção curta não são humanos, embora sejam
primatas racionais oriundos de outras Terras, situadas em linhas históricas alternativas. Nesse sentido, o conto possui elementos de história
natural alternativa, ainda que eu não o classifique como H.A.
Em seguida, falamos
um pouco sobre a antologia Fator Morus, prestes a ser publicada no selo
Nebula. Comentei que, conquanto não haja
personagens humanos em meu conto “Aula Prática”, a humanidade é tópico de uma aula
de história galáctica ministrada numa universidade alienígena. Mencionei a semelhança circunstancial entre
essa narrativa e o conto de história natural alternativa “The Genetics Lecture”
(2005) do Turtledove, publicado originalmente na revista Analog e mais tarde
republicado nas coletâneas do autor, Atlantis and Other Places (Roc
Books, 2010) e The Best of Harry Turtledove (Subterranean Press, 2021).[7] Sem revelar qualquer spoiler, Lu confessou
que o fim do “Aula Prática” tem uma pegada que a deixou algo revoltada. Torço para que os leitores se sintam tão chocados
quanto ela!
* *
*
Enfim, já perto
do término da entrevista (63 minutos), a partir de uma pergunta da Lu sobre a
presença de elementos de história alternativa em muito do que eu escrevo, comentei
o romance curto distópico Pecados Terrestres, uma narrativa
infantojuvenil sem tatibitate que será publicado pela Draco nas próximas semanas. Após uma pincelada célere por alguns dos U.F.
em que venho trabalhando nos últimos anos[8],
falo do romance pandêmico em si, onde tudo dá errado para a civilização global
terrestre, numa narrativa apresentada por Ricardo Mendonça, vulgo “Cabeção”, e ambientada
no U.F. Humanosfera. Comentei ainda que a maioria dos contos,
noveletas e romances que escrevo é ambientada em universos ficcionais extensos,
que acabei revisitando várias vezes ao longo da carreira literária.
Capa de Pecados Terrestres.
Resumo da
ópera: mais uma live divertida em que pude abordar vários dos meus
assuntos favoritos: ficção científica; história alternativa; paixão pelos livros;
atividade & carreira literárias e outros bichos mais.
Tudo graças à
amiga Lu Evans.
Tijuca, Rio de Janeiro, 24 de agosto de 2022 (quarta-feira).
Participantes:
Ana Lúcia
Merege.
Daisy Lodi Ribeiro.
Gerson Lodi-Ribeiro.
Gílson Luís
Cunha (Café Neutrino).
Lu Evans (Anfitriã).
Marcelo Oliveira
(Histórias Incompletas).
Matheus Lima.
Rafael Bertozzo
Duarte.
Rubens Angelo.
Saulo Adami.
Thayane Dantas
(Histórias Incompletas).
[1]. https://www.youtube.com/watch?v=zOsBoK4ueas
. À época da conclusão desta crônica estava
com trinta e sete visualizações.
[2]. Lu Evans alcançou
a marca surpreendente de 24 (vinte e quatro!) antologias organizadas ou
coorganizadas entre 2019 e 2022.
[3]. Nesse trecho
da live, Marcelo Oliveira, meu parceiro na antologia Onde Não Mais,
que deverá ser lançada pela editora Histórias Incompletas em 2023, comentou que
fiquei mais bonito como Carla, referindo-se à capa da coletânea, elaborada por
meu amigo, o publisher da Draco, Erick Cardoso.
[4]. Ao falar do Octopusgarden,
mencionei que a maioria dos personagens desse romance não são humanos, mas sim
dolfinos (mamíferos racionais gengendrados pela humanidade a partir dos genomas
de golfinhos terrígenas) e cefalópodes alienígenas (nativos do planeta oceânico
cedido por nossa espécie aos dolfinos).
[5]. Siegel, Mark: “Love Was the Plan, the Plan
Was… A True Story About James Tiptree,
Jr.”, in Foundation 44 (Inverno, 1989).
[6]. À guisa de perdão pela “morte” da Carla, segue a
dedicatória na coletânea supracitada: “Para todos(as) aqueles(as) que
curtiram os trabalhos da Carla, para aqueles(as) que se afirmaram atraídos(as)
por ela e, sobretudo, para aqueles(as) poucos(as) que souberam manter o segredo,
com minhas desculpas por ter enfim decidido acabar com ela...”
[7]. Nessa narrativa
do papa do subgênero, cujo ponto de divergência se situa mais de quinhentos milhões
de anos atrás, moluscos terrígenas evoluem para ocupar os nichos ecológicos que
em nossa linha natural foram ocupados por nós, vertebrados. Aliás, em meio à aula, o Professor Cthulhu admoesta
seu discípulo Nyarlathotep ao afirmar que considera bastante improvável que
qualquer outro filo zoológico que não o dos moluscos evoluísse até a
racionalidade.
[8]. Sobretudo, o Tramas de Ahapooka; o Três Brasis (Vampiro de Palmares); e o Xochiquetzal.