domingo, 6 de setembro de 2020

 

II Encontro de

Ficção Científica e Ensino de Ciências

(FIOCRUZ)

Dia 1

 

202009032359P5 — 21.974 D.V.

“Ficção científica é tudo aquilo que eu leio, escrevo, compro e vendo como ficção científica.

[Frederik Pohl, autor, editor e publisher de ficção científica]

 

Começou hoje há pouco o aguardado II Encontro de Ficção Científica e Ensino de Ciências, simpósio online patrocinado pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e coordenado pela equipe da professora Anunciata Sawada e do tecnólogo Adílson Júnior.

O evento foi organizado ao longo dos últimos meses, em plena pandemia, daí o formato online.  Justamente o fato de não ter constituído um simpósio presencial é que facultou a presença de um público muito maior do que o das minhas participações anteriores em eventos de divulgação sob os auspícios da FIOCRUZ.

Houve mais de dois mil inscritos e mais de quatrocentas pessoas assistiram a primeira sessão online, não obstante as mais de duas horas de duração.  A apresentação foi disponibilizada no YouTube (https://www.youtube.com/watch?v=xA3h44PFDBM).

Minhas duas participações anteriores foram presenciais.  A primeira se deu há pouco mais de dezesseis anos, em 22 de março de 2004, por ocasião da Tenda de Ciências da FIOCRUZ.  Já a segunda foi no I Encontro de Ficção Científica e Ensino de Ciências, também no campus da instituição, que ocorreu em 19 de novembro de 2015, ocasião em que conheci meus amigos Adílson e Anunciata.[1]


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 Preparei minha apresentação em PowerPoint ao longo da última semana.  Esse trabalho foi livremente inspirado na apresentação de novembro de 2015, que utilizei na mesa-redonda que dividi com a Professora Ieda Tucherman, por ocasião do I Encontro.  Para tanto, podei os tópicos específicos do emprego da FC como ferramenta didática no ensino de ciências (cerne da apresentação anterior) e incluí os relativos à representação da ciência e dos cientistas nos enredos de FC.

Como sabia que a plateia agora seria não só bem maior, mas também mais eclética do que as dos certames de 2004 e 2015, tentei preparar uma apresentação mais leve, embora suspeite que ela talvez não tenha ficado tão leve assim...

Ensaiei duas ou três vezes com o cronômetro do celular ligado para me certificar de que conseguiria fazer a apresentação nos quarenta minutos previstos.  Cravei entre trinta e oito e trinta e nove minutos, mas a coisa toda ficou parecendo meio corrida demais para o meu gosto.  Quando consultei o Adílson e ele garantiu e eu e o Rômulo, professor da UFRJ com quem dividiria a honra de abrir o II Encontro, teríamos dez minutos de tolerância para concluirmos nossas apresentações, fiquei mais relaxado.

Na hora da verdade, consegui apresentar a “Representações da Ciência em Narrativas de Ficção Científica” em cerca de quarenta e cinco minutos.

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 Adílson enviou o e-mail com o link para o aplicativo StreamYard por volta das 15h00 e pediu que nós nos conectássemos meia hora antes do horário previsto para testar se tudo funcionaria direitinho.  Testes efetuados com êxito, eu e Rômulo aproveitamos uns minutos antes do começo do evento para buscar copos d’água.

Francisco Rômulo Monte Ferreira é professor no Instituto de Bioquímica da Universidade Federal do Rio de Janeiro.  Físico por formação, com doutorado em neurociência, hoje se dedica mais à história e à filosofia da ciência, com trabalho paralelo nas relações entre a ciência, a literatura e o cinema.  Além disso, é um entusiasta e um estudioso da história da ficção científica, como eu.  Embora Adílson tenha nos apresentado brevemente tão logo consegui me conectar pelo StreamYard, não houve muito tempo para conversarmos.

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 Este dia 1 do II Encontro começou pontualmente às 19h00, conforme previsto no material de divulgação veiculado pela FIOCRUZ ao longo das últimas duas semanas.

Primeiro, na qualidade de coordenadora do Encontro, Anunciata saudou os palestrantes e os espectadores conectados no canal, desejando a todos boa diversão nas horas seguintes.  Então, passou a palavra ao Adílson, que atuaria como moderador do evento.  Quando esse apresentou meu biolog de forma competente e profissional, aquela fala curta e enxuta de noventa e poucas palavras me pareceu um dos discursos gigantescos de político populista.  Porém, mesmo nervoso com a expectativa de estar prestes a efetuar a apresentação inaugural do simpósio, vibrei quando meu amigo exibiu seu exemplar de meu romance, Octopusgarden (Draco, 2017).


Daí, Adílson me passou a bola e eu liberei a apresentação para o público conectado.  O mais curioso (e preocupante) é que, enquanto exibimos as telas de nossas apresentações em PowerPoint, deixamos de enxergar não só os rostos do outro participante e do moderador, como também a participação da nossa plateia online na lista de comentários.


Comecei a apresentação conceituando ficção científica como gênero, com ajuda das citações de Isaac Asimov e Arthur C. Clarke.  Em seguida, delineei uma breve genealogia idiossincrática do gênero, com ênfase nas alegações canhestras de ancestralidade remota da FC e, sobretudo, na tese advogada pelo autor e estudioso do gênero Brian W. Aldiss em seu Trillion Year Spree: The History of Science Fiction, segundo a qual o gênero teria uma mãe (Mary Shelley) e dois pais (Jules Verne e H.G. Wells).


Daí, passei à rivalidade Verne vs. Wells em torno da missão primordial das narrativas de FC: instruir (segundo Verne) ou entreter (de acordo com Wells).  Então, conceituei a falácia da literatura de antecipação e, enfim, adentrei na abordagem da atividade científica nos enredos do gênero.  Para tanto, falei primeiro do papel dos cientistas como ficcionistas, para então discutir os cientistas como personagens: do clichê do cientista louco ao do cientista-herói.  Toquei na questão dos enredos que propunham ciência produzida por cientistas solitários no fundo de seus quintais ou em seus laboratórios caseiros.  Defendi as tramas e enredos inspirados na ciência tal como ela é feita no mundo real dos séculos XX e XXI, exemplificando com os projetos Manhattan e Apollo, bem como com o sequenciamento do genoma humano e a busca pela vacina contra a Covid-19.  Também falei dos bons exemplos ficcionais, como os romances Time Tunnel (1964) do Murray Leinster e Timescape (1980) do Gregory Benford.  Para concluir, abordei o Complexo de Frankenstein e o papel deletério do autor Michael Crichton como propalador dessa temática ultrapassada.

A título de fecho, num autoplágio confesso, repeti um trecho de minha fala a Tenda da Ciência patrocinada pela FIOCRUZ em 2004:

“Se, por um lado, os trabalhos de ficção científica constituem antes de mais nada narrativas ficcionais e não factuais, por outro, o termo “científica” enfatiza a necessidade da adoção de pressupostos científicos na elaboração de seus enredos.  O ideal, então, é divulgar divertindo, pois a divulgação através do prazer, a aprendizagem lúdica, é sempre a mais efetiva.”

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Ao terminar minha fala e desligar minha apresentação, pude constatar o público presente na lista de comentários e constatar o comparecimento de alguns amigos e personalidades conhecidas da comunidade fantástica brasileira.  Os autores Alexey Dodsworth, Ana Lúcia Merege, Nikelen Witter e Octavio Aragão.  O presidente do Clube de Leitores de Ficção Científica, Luiz Felipe Vasques.  Minha amiga do grupo de discussão em literatura fantástica (do qual Adílson também faz parte), Juliana Berlim.  O pesquisador e divulgador incansável do gênero Alexander Meireles da Silva, responsável pelo canal Fantasticursos.

Porém, essa visualização de nomes conhecidos foi breve e, portanto, suspeito, incompleta.  Pois, Adílson logo apresentou o Rômulo e lhe passou a palavra.  Cumpria assistir à apresentação do colega.




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Rômulo efetuou sua apresentação “Ficção Científica e a Contemporaneidade” com brilhantismo, abordando diversos tópicos e temáticas relevantes, como, por exemplo, na conceituação da literatura; questões de identidade no romance Alice no País das Maravilhas (1865) de Lewis Carroll; na obsolescência dos conceitos de FC hard e FC soft; nas pinceladas pertinentes na taxonomia do gênero, com citações aos conceitos de Darko Suvin e à escola formalista russa liderada por Tzvetan Todorov; na relevância do romance Solaris (1961), de Stanislaw Lem em termos de filosofia da ciência; e concluiu com o trans-humanismo, ali representado pelo advento de robôs e inteligências artificiais.

Após a conclusão de Rômulo, Adílson nos apresentou as perguntas escritas por nossa plateia virtual na lista de comentários.  Respondemos de tudo um pouco.  Das reclamações por não havermos citado o seriado Ricky & Morty ou o Professor Pardal no quesito Cientistas Loucos, até o questionamento por causa do cognome da FC, “Literatura de Antecipação”; da dicotomia entre Utopia e Distopia; à necessidade de fidelidade na adaptação cinematográfica ou televisiva de narrativas fantásticas literárias; e ao emprego em sala de aula das narrativas de FC embasadas nas ciências sociais.


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 Finda a transmissão deste primeiro dia do II Encontro de Ficção Científica e Ensino de Ciências, ao abrir minha caixa de e-mails, descobri mais de trinta solicitações para o envio de cópias em PDF da apresentação desta noite.  Pelo visto, a galera realmente prestou atenção à minha fala.😊

Jardim Botânico, Rio de Janeiro, 03 de setembro de 2020 (quinta-feira).

 

 


Participantes:

Adílson Júnior (moderador).

Alexander Meireles da Silva.

Alexey Dodsworth.

Ana Lúcia Merege.

Anunciata Sawada (coordenadora).

Francisco Rômulo Monte Ferreira (apresentador).

Gerson Lodi-Ribeiro (apresentador).

Juliana Berlim.

Luiz Felipe Vasques.

Nikelen Witter.

Octavio Aragão.

 

 

 

2 comentários:

  1. Ah, a palestra foi realmente magnífica, fiquei vidrada em sua fala. Anotei cada vírgula com medo de perder algo! Grande oportunidade ouvir a você, e ao Rômulo!
    Abraços

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  2. Obrigado, Lygia. Fico feliz que tenha gostado.

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