terça-feira, 23 de julho de 2019


Cinquentenário da Conquista da Lua
no Planetário da Gávea


201907202359P7 — 21.561 D.V.


“Mas por que, dizem alguns, a Lua?  Por que escolher isto como nosso objetivo?  E também podem muito bem perguntar, por que escalar a montanha mais alta?  Por que, 35 anos atrás, voar pelo Atlântico?  Por que Rice joga com Texas?

“Nós escolhemos ir para a Lua!  Nós escolhemos ir para a Lua...  Nós escolhemos ir para a Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque elas são fáceis, mas porque elas são difíceis; porque esse objetivo servirá para organizar e medir o melhor das nossas energias e habilidades, porque o desafio é um que estamos dispostos a aceitar, um que não estamos dispostos a adiar e um que temos a intenção de vencer, e os outros, também.”

[John F. Kennedy, Estádio Rice, 12 de setembro de 1962]




Almoçamos no Delírio Tropical da Gávea e dali fomos a pé até o Planetário.  Chegamos por volta das 14h00 à entrada da instituição virada (mais ou menos) para a rua Marquês de São Vicente.  Nossa entrada foi franqueada quando nos apresentamos à recepção como componente da mesa-redonda e acompanhante.  Dali fomos conduzimos à presença do diretor de astronomia, Alexandre Cherman e do curador da exposição prestes a ser aberta, meu veterano na graduação de Astronomia na UFRJ, Naelton Araújo.

Chamada para a Exposição.



Cherman nos conduziu até a exposição e nos apresentou ao adido cultural do Consulado dos EUA no Rio de Janeiro, Kevin Broshahan[1] e aos outros diretores da Fundação Planetário.  Antes da fita de abertura da exposição Um Gigantesco Passo: A Jornada para a Lua ser cortada, eu e Cláudia tivemos o privilégio de visitá-la sozinhos e de tirar algumas fotos sem acotovelamentos, pois o público presente na instituição neste sábado ensolarado de inverno atendeu plenamente as expectativas dos organizadores.

A exposição foi aberta pontualmente às 14h30.  Alexandre Cherman apresentou um discurso breve em nome do Planetário e em seguida passou a palavra ao adido cultural norte-americano, que se expressou em português perfeitamente inteligível.  Em seguida, a palavra foi passada ao representante da Empresa de Correios e Telégrafos, para que se procedesse ao lançamento de um selo comemorativo em homenagem ao jubileu de ouro da primeira alunissagem da história.


Abertura da Exposição Um Gigantesco Passo: A Jornada para a Lua
Fala do adido cultural do Consulado dos EUA, Kevin Broshahan.

Exposição - Módulo Lunar (Eagle) em escala 1:3.

Exposição - Neil A. Armstrong.


*     *      *



Finda a cerimônia de abertura da exposição, dirigimo-nos lentamente à Cúpula Galileu Galilei, onde, às 15h30, seria exibido o longa-metragem O Primeiro Homem (2018)[2], após o qual se daria nossa mesa-redonda.  A Galileu Galilei é bem menor do que a Carl Sagan, cúpula principal da instituição, onde costumam se desenrolar as sessões do cineclube de ficção científica do Planetário e que esteve alocada hoje para as sessões horárias de um curta-metragem sobre a Conquista da Lua, que sempre se iniciava nas horas cheias.

Cláudia e eu gostamos muito desse filme dirigido por Damien Chazelle e protagonizado por Ryan Gosling, no papel de Neil Armstrong.  Apesar da duração (2h20min), o longa não se mostrou maçante, longe disso.  Como o próprio título insinua, a narrativa constitui antes um drama biográfico sobre a vida do astronauta Neil A. Armstrong entre os anos de 1961 e 1969 do que a aventura  da corrida espacial em geral e da conquista da Lua em particular.  Daí, quase toda a ação dramática se desenvolve sob o ponto de vista de Armstrong, desde a morte dos três astronautas no teste do módulo de comando da Apollo I, até a missão Apollo XI, passando pela morte de sua filhinha e o relacionamento, por vezes frio e desprovido de empatia com a esposa Janet e os dois filhos sobreviventes do casal.  Como protagonista, Armstrong é retratado como um sujeito focado e tranquilo, com certa dificuldade de expressar suas emoções.  Uma visão humana do grande herói da astronáutica.  Como falei acima, gostamos muito!

Faltando cerca de meia hora para terminar a projeção, saí brevemente da cúpula para tentar contatar meu amigo de longa data, Gustavo Frederico Porto de Mello, que também participaria da mesa-redonda.  Por coincidência ou sincronicidade, encontrei-o no toalete masculino da cúpula, enquanto ligava meu celular (que estava com bateria fraca) para tentar descobrir se ele já havia chegado.

Após trocarmos umas poucas palavras, ele, que já havia assistido o longa três vezes, admoestou-me a regressar à cúpula para não perder o clímax do filme.

*     *      *



Concluída a exibição d’O Primeiro Homem, quando as luzes se acenderam por volta das 18h00, Naelton me convocou ao palco para abrir a mesa-redonda.  Contudo, felizmente, avistei meu amigo Luiz Felipe Vasques na plateia e o convoquei para assumir seu posto de mediador.[3]

Luiz Felipe convocou ao palco o astrônomo do Observatório do Valongo, Gustavo Porto de Mello; o estudioso de FC e ex-presidente do Clube de Leitores de Ficção Científica, Eduardo Torres; eu; e o astrônomo da Fundação Planetário, Naelton Araújo.

Na plateia de cerca de trinta pessoas, estiveram amigos queridos como nosso sobrinho e afilhado, Bruno Borsaro Lodi Ribeiro; os participantes do Vórtice Fantástico, Juliana Berlim e Ricardo França; e nosso parceiro de várias lides literárias, Flávio Lúcio Abal.

Começamos falando do filme, de como havíamos gostado e de como ele nos impactou.  Edu Torres destrinchou a questão dos erros de overflow no sistema de pilotagem da Apollo XI, que apavoraram Armstrong e Aldrin, o Controle da Missão em Houston e, é claro, os expectadores do filme, embora soubéssemos que tudo acabaria bem.  Na minha vez, comparei os percalços da Conquista da Lua aos da Conquista do Polo Sul no início do século XX, em termos de superação de dificuldades técnicas e de corrida científica turbinada pelas grandes potências geopolíticas da época, dentre elas, o Império Britânico.  Também abordei as diferenças cruciais entre missões tripuladas à Lua e ao planeta Marte, advindas, sobretudo, do fato de o planeta vermelho, dependendo de sua posição orbital, situar-se entre duzentas e mil vezes mais distante da Terra do que o nosso satélite natural.  Em seguida, discutimos as pretensões norte-americanas de regressar à Lua e instalar uma base permanente no polo sul do satélite, além de uma estação espacial em órbita circunlunar, como espécie de trampolim para futuras missões tripuladas a Marte.  Falamos também da participação da iniciativa privada e do capital privado nessa nova corrida espacial; dos êxitos e malogros dos ônibus espaciais; da importância de instalar bases tripuladas permanentes no espaço, na Lua e em Marte; da logística, dos custos e das motivações de se enviar missões tripuladas e não tripuladas ao espaço.  Também abordamos as descobertas recentes de planetas extrassolares e da perspectiva ainda remota de alcançá-los com microssondas.  Não nos esquecemos das perspectivas comerciais da extração de hélio 3 dos rególitos lunares e dos métodos de propulsão mais eficientes do que os foguetes químicos.

Enfim, na sessão de perguntas e comentários, a plateia indagou sobre alguns dos tópicos debatidos pelos participantes da mesa e enriqueceu a discussão com temas correlatos de sua própria lavra, como, por exemplo, a possibilidade de impactos de meteoritos gigantes contra a Terra; sistemas de propulsão pseudocientíficos; terraformização de Marte e de Vênus; os riscos da radiação para os astronautas durante as missões tripuladas de longa duração Sistema Solar afora; e diversos outros assuntos que, conquanto instigantes, eu não me recordo agora.

Naelton se viu obrigado a encerrar a mesa em torno das 20h00, pois a previsão inicial de uma sessão de cúpula para que os visitantes do Planetário pudessem observar os planetas e estrelas foi confirmada pelas condições meteorológicas favoráveis.

No encontro que tivemos à saída da Cúpula Galileu Galilei, Gustavo nos apresentou à namorada, Andrea de Vasconcellos e eu os apresentei à Cláudia.  Nosso sobrinho Bruno se uniu a nós para um bate-papo esperto, porém breve, uma vez que ele já tinha compromissos inadiáveis com a balada de sábado à noite.  Juliana Berlim trouxe seu exemplar da coletânea Histórias de Ficção Científica por Carla Cristina Pereira (Draco, 2012), adquirida na Casa Fantástica da FLIP, para que eu autografasse.

Com saudades de Gustavo, que eu já não via pessoalmente há trinta e três anos, convidei-o para jantar.  Cláudia e Andrea toparam, mas, após uma permanência de mais de quatro horas no interior daquela cúpula gelada, exigiram que o repasto se desse num restaurante fechado e “quentinho”.  Por motivos óbvios e compreensíveis, a maioria dos presentes preferiu, subir para a sessão de cúpula.  Afinal, não é todos os dias que se está num observatório ou planetário sob condições meteorológicas propícias.  Só o amigo Ricardo França se uniu a nós para o jantar.


Mesa-Redonda na Cúpula Galileu Galilei.
Naelton Araújo, Luiz Felipe Vasques, Gustavo Porto de Mello, GL-R e Eduardo Torres.

GL-R na Mesa-Redonda.

Saída do Planetário: Bruno Borsaro, GL-R, Gustavo Porto de Mello, Ricardo França.




*     *      *



Saímos do Planetário a pé, grosso modo, às 20h30, rumo ao Shopping da Gávea.  Uma vez lá, dirigimo-nos ao segundo piso para conferir um restaurante metido a chique, mas acabamos regressando ao térreo e, após alguma hesitação, escolhemos o Beluga, casa especializada em pratos à base de batata rosti, onde enfim aportamos e permanecemos pelas três horas seguintes.  O papo foi tão animado que acabei esquecendo de ligar para o Felipe ou o Eduardo para dizer onde estávamos para que eles eventualmente pudessem se unir a nós.

Ricardo, Cláudia e eu pedimos batatas rostis, sendo que ele conseguiu descolar uma rosti vegetariana para si.  Gustavo pediu uma costela suína com molho barbecue que pareceu tão apetitosa quanto sua congênere do Outback.  Andrea pediu um prato com camarões.  Tanto a costela quanto os camarões vieram acompanhados por meias porções de rosti.  Ricardo e Cláudia beberam sucos; Gustavo & Andrea, cerveja.  Como a carta de vinho do Beluga se limitava a dois rótulos de 187 mililitros desconhecidos, pelos quais a casa se propunha cobrar vinte e três reais, preferi beber água com gás, mesmo sob os protestos veementes de Gustavo, que se afirmou preocupado com a minha saúde.

Conversamos bastante sobre nossos filhos, nossas vidas e nossas carreiras, colocando nossas biografias em dia, pois Gustavo ainda acreditava que eu estava na Marinha, organização militar da qual pedi baixa no primeiro semestre de 1990.

Também conversamos um bocado sobre violência urbana no Rio de Janeiro e alhures; sobre nosso amigo comum, Alexey Dodsworth; sobre atividades literárias; sobre o finado e saudoso Clube de Ficção Científica Antares, do qual eu e Gustavo fomos sócios na primeira metade da década de 1980; e sobre as atividades recentes no Vórtice Fantástico e no CLFC que eu e Ricardo compartilhamos.

Ao longo do jantar, comentamos dezenas de enredos de ficção científica.  Dentre os mais icônicos dos quais me lembro dentre os muitos que debatemos, esteve a coletânea City (1951),[4] do Clifford D. Simak, uma solarpunk avant le lettre, que delineei quando Gustavo me pediu para recomendar um livro do meu autor predileto.  Gustavo descreveu com empolgação para Ricardo França o romance de ficção científica hard The Mote in God’s Eye, da dupla Larry Niven & Jerry Pournelle — uma das melhores descrições de civilização alienígena que já li.  Para deleite de meus amigos, destrinchei a tetralogia de história alternativa Worldwar, do Harry Turtledove, em que o autor propõe uma invasão alienígena em plena Segunda Guerra Mundial.

Quando finalmente saímos do Beluga, o Shopping da Gávea já estava fechando.  Rumamos para a única saída ainda aberta, onde nos deparamos com uma pequena multidão de pessoas paradas com celulares na mão, pedindo UBER ou táxis de aplicativos.  Pelo visto, desembocamos no público que havia acabado de sair das últimas sessões de teatro deste sábado à noite.  Ainda permanecemos junto à porta do shopping por mais alguns minutos, o papo animado como desde a caminhada do Planetário ao Beluga, até que o UBER do Gustavo e da Andrea chegou.  Daí, Ricardo partiu a pé até seu ponto de ônibus e nós tentamos pegar um táxi ali mesmo.  Como estava difícil, pedimos nosso próprio UBER e cinco minutos mais tarde, estávamos em casa.

Em desagravo, tomei uma taça do tinto Quinta das Amoras, enquanto assistia a cena d’O Primeiro Homem, que eu havia perdido no Planetário, pois o longa estreou hoje à noite no Telecine.

Jardim Botânico, Rio de Janeiro, 20 de julho de 2019 (sábado).










Participantes:

Alexandre Cherman.

Andrea de Vasconcellos.

Bruno Borsaro Lodi Ribeiro.

Cláudia Quevedo Lodi.

Flávio Lúcio Abal.

Gerson Lodi-Ribeiro.

Gustavo F. Porto de Mello.

Juliana Berlim.

Kevin Broshahan.

Luiz Felipe Vasques.

Naelton Araújo.

Ricardo França.









[1].  A exposição é fruto de uma parceria estabelecida entre o Planetário da Gávea e o Consulado dos Estados Unidos no Rio de Janeiro.
[2].  Por questões burocráticas alheias à vontade da Fundação Planetário, o título do filme só foi anunciado ao público minutos antes do início da exibição.
[3].  Felipe passou a manhã no Centro por causa da exposição Anima Mundi.  Como não sabia se lograria chegar a tempo para o início da mesa, escalou-me para assumir seu lugar pro tempore, até que conseguisse chegar ao Planetário.  Gustavo de Mello foi outro que chegou pouco antes do início, pois esteve engajado numa outra mesa-redonda de tema correlato no Museu do Amanhã.
[4].  No fundo, sob a forma de livro, City constitui antes um romance fix-up do que uma coletânea, pois os diversos contos e noveletas se exibem conectados por trechos curtos, nos quais o cão inteligente que teria organizado a coleção de contos folclóricos atribuídos à legendária humanidade, discute justamente a existência das figuras mitológicas dos humanos.

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