Cinquentenário da Conquista da Lua
no Planetário da Gávea
201907202359P7 — 21.561 D.V.
“Mas
por que, dizem alguns, a Lua? Por que
escolher isto como nosso objetivo? E
também podem muito bem perguntar, por que escalar a montanha
mais alta? Por que, 35 anos atrás, voar pelo Atlântico? Por que Rice joga com Texas?
“Nós
escolhemos ir para a Lua! Nós escolhemos
ir para a Lua... Nós escolhemos ir para
a Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque elas são fáceis, mas porque
elas são difíceis; porque esse objetivo servirá para organizar e medir o melhor
das nossas energias e habilidades, porque o desafio é um que estamos dispostos
a aceitar, um que não estamos dispostos a adiar e um que temos a intenção de
vencer, e os outros, também.”
[John F.
Kennedy, Estádio Rice, 12 de setembro de 1962]
Almoçamos no Delírio
Tropical da Gávea e dali fomos a pé até o Planetário. Chegamos por volta das 14h00 à entrada da instituição
virada (mais ou menos) para a rua Marquês de São Vicente. Nossa entrada foi franqueada quando nos apresentamos
à recepção como componente da mesa-redonda e acompanhante. Dali fomos conduzimos à presença do diretor
de astronomia, Alexandre Cherman e do curador da exposição prestes a ser
aberta, meu veterano na graduação de Astronomia na UFRJ, Naelton Araújo.
Chamada para a Exposição.
Cherman nos
conduziu até a exposição e nos apresentou ao adido cultural do Consulado dos EUA
no Rio de Janeiro, Kevin Broshahan[1]
e aos outros diretores da Fundação Planetário.
Antes da fita de abertura da exposição Um Gigantesco Passo: A Jornada
para a Lua ser cortada, eu e Cláudia tivemos o privilégio de visitá-la sozinhos
e de tirar algumas fotos sem acotovelamentos, pois o público presente na instituição
neste sábado ensolarado de inverno atendeu plenamente as expectativas dos
organizadores.
A exposição foi
aberta pontualmente às 14h30. Alexandre
Cherman apresentou um discurso breve em nome do Planetário e em seguida passou
a palavra ao adido cultural norte-americano, que se expressou em português perfeitamente
inteligível. Em seguida, a palavra foi
passada ao representante da Empresa de Correios e Telégrafos, para que se
procedesse ao lançamento de um selo comemorativo em homenagem ao jubileu de
ouro da primeira alunissagem da história.
Abertura da Exposição Um Gigantesco Passo: A Jornada para a Lua -
Fala do adido cultural do Consulado dos EUA, Kevin Broshahan.
Exposição - Módulo Lunar (Eagle) em escala 1:3.
Exposição - Neil A. Armstrong.
* *
*
Finda a cerimônia
de abertura da exposição, dirigimo-nos lentamente à Cúpula Galileu Galilei,
onde, às 15h30, seria exibido o longa-metragem O Primeiro Homem (2018)[2],
após o qual se daria nossa mesa-redonda.
A Galileu Galilei é bem menor do que a Carl Sagan, cúpula principal da instituição,
onde costumam se desenrolar as sessões do cineclube de ficção científica do Planetário
e que esteve alocada hoje para as sessões horárias de um curta-metragem sobre a
Conquista da Lua, que sempre se iniciava nas horas cheias.
Cláudia e eu
gostamos muito desse filme dirigido por Damien Chazelle e protagonizado por
Ryan Gosling, no papel de Neil Armstrong.
Apesar da duração (2h20min), o longa não se mostrou maçante, longe
disso. Como o próprio título insinua, a
narrativa constitui antes um drama biográfico sobre a vida do astronauta Neil
A. Armstrong entre os anos de 1961 e 1969 do que a aventura da corrida espacial em geral e da conquista
da Lua em particular. Daí, quase toda a ação
dramática se desenvolve sob o ponto de vista de Armstrong, desde a morte dos três
astronautas no teste do módulo de comando da Apollo I, até a missão Apollo
XI, passando pela morte de sua filhinha e o relacionamento, por vezes frio e desprovido
de empatia com a esposa Janet e os dois filhos sobreviventes do casal. Como protagonista, Armstrong é retratado como
um sujeito focado e tranquilo, com certa dificuldade de expressar suas emoções. Uma visão humana do grande herói da astronáutica. Como falei acima, gostamos muito!
Faltando cerca
de meia hora para terminar a projeção, saí brevemente da cúpula para tentar
contatar meu amigo de longa data, Gustavo Frederico Porto de Mello, que também participaria
da mesa-redonda. Por coincidência ou
sincronicidade, encontrei-o no toalete masculino da cúpula, enquanto ligava meu
celular (que estava com bateria fraca) para tentar descobrir se ele já havia
chegado.
Após trocarmos
umas poucas palavras, ele, que já havia assistido o longa três vezes,
admoestou-me a regressar à cúpula para não perder o clímax do filme.
* *
*
Concluída a exibição
d’O Primeiro Homem, quando as luzes se acenderam por volta das 18h00, Naelton
me convocou ao palco para abrir a mesa-redonda.
Contudo, felizmente, avistei meu amigo Luiz Felipe Vasques na plateia e
o convoquei para assumir seu posto de mediador.[3]
Luiz Felipe
convocou ao palco o astrônomo do Observatório do Valongo, Gustavo Porto de
Mello; o estudioso de FC e ex-presidente do Clube de Leitores de Ficção Científica,
Eduardo Torres; eu; e o astrônomo da Fundação Planetário, Naelton Araújo.
Na plateia de
cerca de trinta pessoas, estiveram amigos queridos como nosso sobrinho e afilhado,
Bruno Borsaro Lodi Ribeiro; os participantes do Vórtice Fantástico, Juliana
Berlim e Ricardo França; e nosso parceiro de várias lides literárias, Flávio Lúcio
Abal.
Começamos
falando do filme, de como havíamos gostado e de como ele nos impactou. Edu Torres destrinchou a questão dos erros de
overflow no sistema de pilotagem da Apollo XI, que apavoraram
Armstrong e Aldrin, o Controle da Missão em Houston e, é claro, os expectadores
do filme, embora soubéssemos que tudo acabaria bem. Na minha vez, comparei os percalços da Conquista
da Lua aos da Conquista do Polo Sul no início do século XX, em termos de superação
de dificuldades técnicas e de corrida científica turbinada pelas grandes potências
geopolíticas da época, dentre elas, o Império Britânico. Também abordei as diferenças cruciais entre missões
tripuladas à Lua e ao planeta Marte, advindas, sobretudo, do fato de o planeta
vermelho, dependendo de sua posição orbital, situar-se entre duzentas e mil
vezes mais distante da Terra do que o nosso satélite natural. Em seguida, discutimos as pretensões norte-americanas
de regressar à Lua e instalar uma base permanente no polo sul do satélite, além
de uma estação espacial em órbita circunlunar, como espécie de trampolim para
futuras missões tripuladas a Marte. Falamos
também da participação da iniciativa privada e do capital privado nessa nova
corrida espacial; dos êxitos e malogros dos ônibus espaciais; da importância de
instalar bases tripuladas permanentes no espaço, na Lua e em Marte; da logística,
dos custos e das motivações de se enviar missões tripuladas e não tripuladas ao
espaço. Também abordamos as descobertas
recentes de planetas extrassolares e da perspectiva ainda remota de alcançá-los
com microssondas. Não nos esquecemos das
perspectivas comerciais da extração de hélio 3 dos rególitos lunares e dos métodos
de propulsão mais eficientes do que os foguetes químicos.
Enfim, na sessão
de perguntas e comentários, a plateia indagou sobre alguns dos tópicos debatidos
pelos participantes da mesa e enriqueceu a discussão com temas correlatos de
sua própria lavra, como, por exemplo, a possibilidade de impactos de meteoritos
gigantes contra a Terra; sistemas de propulsão pseudocientíficos; terraformização
de Marte e de Vênus; os riscos da radiação para os astronautas durante as missões
tripuladas de longa duração Sistema Solar afora; e diversos outros assuntos que,
conquanto instigantes, eu não me recordo agora.
Naelton se
viu obrigado a encerrar a mesa em torno das 20h00, pois a previsão inicial de
uma sessão de cúpula para que os visitantes do Planetário pudessem observar os
planetas e estrelas foi confirmada pelas condições meteorológicas favoráveis.
No encontro
que tivemos à saída da Cúpula Galileu Galilei, Gustavo nos apresentou à namorada,
Andrea de Vasconcellos e eu os apresentei à Cláudia. Nosso sobrinho Bruno se uniu a nós para um
bate-papo esperto, porém breve, uma vez que ele já tinha compromissos inadiáveis
com a balada de sábado à noite. Juliana
Berlim trouxe seu exemplar da coletânea Histórias de Ficção Científica por
Carla Cristina Pereira (Draco, 2012), adquirida na Casa Fantástica da FLIP,
para que eu autografasse.
Com saudades
de Gustavo, que eu já não via pessoalmente há trinta e três anos, convidei-o para
jantar. Cláudia e Andrea toparam, mas, após
uma permanência de mais de quatro horas no interior daquela cúpula gelada,
exigiram que o repasto se desse num restaurante fechado e “quentinho”. Por motivos óbvios e compreensíveis, a maioria
dos presentes preferiu, subir para a sessão de cúpula. Afinal, não é todos os dias que se está num observatório
ou planetário sob condições meteorológicas propícias. Só o amigo Ricardo França se uniu a nós para o
jantar.
Mesa-Redonda na Cúpula Galileu Galilei.
Naelton Araújo, Luiz Felipe Vasques, Gustavo Porto de Mello, GL-R e Eduardo Torres.
GL-R na Mesa-Redonda.
Saída do Planetário: Bruno Borsaro, GL-R, Gustavo Porto de Mello, Ricardo França.
* *
*
Saímos do Planetário
a pé, grosso modo, às 20h30, rumo ao Shopping da Gávea. Uma vez lá, dirigimo-nos ao segundo piso para
conferir um restaurante metido a chique, mas acabamos regressando ao térreo e, após
alguma hesitação, escolhemos o Beluga, casa especializada em pratos à base de
batata rosti, onde enfim aportamos e permanecemos pelas três horas seguintes. O papo foi tão animado que acabei esquecendo
de ligar para o Felipe ou o Eduardo para dizer onde estávamos para que eles
eventualmente pudessem se unir a nós.
Ricardo,
Cláudia e eu pedimos batatas rostis, sendo que ele conseguiu descolar uma rosti
vegetariana para si. Gustavo pediu uma
costela suína com molho barbecue que pareceu tão apetitosa quanto sua congênere
do Outback. Andrea pediu um prato com camarões. Tanto a costela quanto os camarões vieram acompanhados
por meias porções de rosti. Ricardo e
Cláudia beberam sucos; Gustavo & Andrea, cerveja. Como a carta de vinho do Beluga se limitava a
dois rótulos de 187 mililitros desconhecidos, pelos quais a casa se propunha
cobrar vinte e três reais, preferi beber água com gás, mesmo sob os protestos
veementes de Gustavo, que se afirmou preocupado com a minha saúde.
Conversamos bastante
sobre nossos filhos, nossas vidas e nossas carreiras, colocando nossas
biografias em dia, pois Gustavo ainda acreditava que eu estava na Marinha, organização
militar da qual pedi baixa no primeiro semestre de 1990.
Também conversamos
um bocado sobre violência urbana no Rio de Janeiro e alhures; sobre nosso amigo
comum, Alexey Dodsworth; sobre atividades literárias; sobre o finado e saudoso
Clube de Ficção Científica Antares, do qual eu e Gustavo fomos sócios na
primeira metade da década de 1980; e sobre as atividades recentes no Vórtice Fantástico
e no CLFC que eu e Ricardo compartilhamos.
Ao longo do
jantar, comentamos dezenas de enredos de ficção científica. Dentre os mais icônicos dos quais me lembro
dentre os muitos que debatemos, esteve a coletânea City (1951),[4]
do Clifford D. Simak, uma solarpunk avant le lettre, que delineei quando
Gustavo me pediu para recomendar um livro do meu autor predileto. Gustavo descreveu com empolgação para Ricardo
França o romance de ficção científica hard The Mote in God’s Eye, da
dupla Larry Niven & Jerry Pournelle — uma das melhores descrições de civilização
alienígena que já li. Para deleite de
meus amigos, destrinchei a tetralogia de história alternativa Worldwar, do Harry Turtledove, em que o
autor propõe uma invasão alienígena em plena Segunda Guerra Mundial.
Quando
finalmente saímos do Beluga, o Shopping da Gávea já estava fechando. Rumamos para a única saída ainda aberta, onde
nos deparamos com uma pequena multidão de pessoas paradas com celulares na mão,
pedindo UBER ou táxis de aplicativos. Pelo
visto, desembocamos no público que havia acabado de sair das últimas sessões de
teatro deste sábado à noite. Ainda permanecemos
junto à porta do shopping por mais alguns minutos, o papo animado como desde a
caminhada do Planetário ao Beluga, até que o UBER do Gustavo e da Andrea
chegou. Daí, Ricardo partiu a pé até seu
ponto de ônibus e nós tentamos pegar um táxi ali mesmo. Como estava difícil, pedimos nosso próprio UBER
e cinco minutos mais tarde, estávamos em casa.
Em desagravo,
tomei uma taça do tinto Quinta das Amoras, enquanto assistia a cena d’O
Primeiro Homem, que eu havia perdido no Planetário, pois o longa estreou
hoje à noite no Telecine.
Jardim Botânico, Rio de Janeiro, 20 de julho de 2019 (sábado).
Participantes:
Alexandre
Cherman.
Andrea de
Vasconcellos.
Bruno Borsaro
Lodi Ribeiro.
Cláudia
Quevedo Lodi.
Flávio Lúcio
Abal.
Gerson
Lodi-Ribeiro.
Gustavo F. Porto de Mello.
Juliana Berlim.
Kevin Broshahan.
Luiz Felipe Vasques.
Naelton Araújo.
Ricardo França.
[1]. A exposição é fruto
de uma parceria estabelecida entre o Planetário da Gávea e o Consulado dos
Estados Unidos no Rio de Janeiro.
[2]. Por questões burocráticas
alheias à vontade da Fundação Planetário, o título do filme só foi anunciado ao
público minutos antes do início da exibição.
[3]. Felipe passou
a manhã no Centro por causa da exposição Anima Mundi. Como não sabia se lograria chegar a tempo
para o início da mesa, escalou-me para assumir seu lugar pro tempore, até
que conseguisse chegar ao Planetário.
Gustavo de Mello foi outro que chegou pouco antes do início, pois esteve
engajado numa outra mesa-redonda de tema correlato no Museu do Amanhã.
[4]. No fundo, sob a
forma de livro, City constitui antes um romance fix-up do que uma
coletânea, pois os diversos contos e noveletas se exibem conectados por trechos
curtos, nos quais o cão inteligente que teria organizado a coleção de contos folclóricos
atribuídos à legendária humanidade, discute justamente a existência das figuras
mitológicas dos humanos.
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