segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Aventuras do Vampiro de Palmares no Vórtice Fantástico

201507252359P7  —  20.106 D.V.

“The way the future was.”
[Frederik Pohl]

Compareci hoje à tarde na Biblioteca Parque Estadual, em frente ao Campo de Santana, no centro do Rio, para a sessão mensal do núcleo carioca do Vórtice Fantástico.  A iniciativa literária Vórtice Fantástico tem como proposta se reunir mensalmente para discutir um livro lido pelos participantes, na tradição veneranda dos clubes de leitura existentes há muito no Brasil e no exterior.  A diferença é que o Vórtice é um clube de leitura de literatura fantástica, ao que eu saiba, a primeira iniciativa desse tipo a contemplar o gênero por estas plagas.
Proposta por Raquel Moritz de Blumenau e Bruna Miranda de São Paulo no início do ano, a iniciativa do Vórtice Fantástico já se espalhou por catorze cidades brasileiras.  Dentre elas, o Rio de Janeiro.   Os participantes elegeram este mês de julho como mês do autor brasileiro.  Cada núcleo regional escolheu um livro para ler e discutir.  O núcleo carioca escolheu meu romance Aventuras do Vampiro de Palmares (Draco, 2014).
Ao saber dessa escolha pouco menos de um mês atrás, pela Renata Aquino, via Facebook, entrei em contato para agradecer e ela me perguntou se eu gostaria de participar.  Aceitei o convite mais que depressa, bastante honrado e também um pouco surpreso com a escolha do grupo.

*     *      *

Fui para o centro de metrô, saltei na estação Presidente Vargas e acabei chegando à Biblioteca Parque Estadual com uns vinte minutos de antecedência.  Assim que entrei reconheci a fisionomia da Renata, sentada junto com outros quatro participantes do núcleo carioca do Vórtice: Daniel Faleiro, Stella Rosemberg, Eliseu Ferreira e Alberth Moreira.  Enquanto aguardávamos a hora combinada (15h00) para passarmos ao espaço de convivência, onde nos reuniríamos, Renata, Stella e Daniel me explicaram que aquela era a segunda reunião do núcleo, a primeira, no último sábado de junho, discutiu o romance clássico Neuromancer, do William Gibson.  Em contrapartida, contei alguns fatos sobre os primórdios do Clube de Leitores de Ficção Científica, o que para eles já faz parte da história da implantação desse gênero literário no Brasil.
Às 15h00 em ponto chegou Thaís Cavalcante, a coordenadora do núcleo carioca.  Guardamos nossas bolsas e sacolas no guarda-volumes e então passamos ao espaço de convivência.  Sentamos num dos sofás semicirculares existentes no local.
Depois de agradecer a escolha do romance e me declarar honrado por ter sido o autor brasileiro selecionado pelo núcleo carioca, como é do meu feitio tagarela, falei um bocado sobre a gênese do universo ficcional Três Brasis, onde estão inseridas as cinco narrativas que compõem o romance Aventuras do Vampiro de Palmares.  Contei que três delas já haviam sido publicadas anteriormente e que todas foram escritas para funcionar como narrativas completas.  Também confessei a existência de duas aventuras do Dentes Compridos que não constam do romance, bem como quatro narrativas ambientadas neste U.F. em que o protagonista do Aventuras... não aparece.  Falei um pouco sobre as motivações para escrever história alternativa em geral e as narrativas dessa linha histórica alternativa em particular.  Para mim, de longe o melhor da festa foi a saraivada de perguntas para lá de pertinentes com as quais os seis participantes me brindaram, deixando bem claro que haviam lido e apreciado o romance.  Alberth comentou ter apreciado os mitos de criação do Povo Verdadeiro delineado na primeira parte do livro, “Crepúsculo Matutino”.  Eliseu afirmou ter gostado bastante da cena do confronto do protagonista com a princesa banta e o espadachim gascão na segunda parte, “O Vampiro de Nova Holanda”.  Nessa mesma parte, Stella e Renata parecem ter gostado mais da personagem de Amalamale, a princesa sem medo.  Daniel declarou ter gostado de ler um romance de literatura fantástica ambientado no Brasil.  Já Thaís considerou o confronto de Dentes Compridos com uma releitura da Jack o Estripador, à luz da ficção científica e da história alternativa, descrito na quinta e última parte, “Assessor para Assuntos Fúnebres” como o lance mais legal do romance.

Bate-papo sobre o Aventuras do Vampiro de Palmares no Vórtice Fantástico.


Nosso bate-papo nessa tarde chuvosa de inverno não se limitou ao Aventuras do Vampiro de Palmares.  Falamos sobre a paixão pelos livros em geral e pela literatura fantástica em particular.  Comentei que embora o gênero viva um boom no país atualmente tanto em termos de publicação de traduções de autores estrangeiros quanto do lançamento de autores nacionais, a ficção científica em si tem sido encarada atualmente como uma espécie de prima pobre da literatura fantástica lusófona.  Falamos também sobre as motivações do autor brasileiro para ambientar (ou não) suas narrativas no país.
Thaís me perguntou sobre meus autores favoritos, dando margem para que eu falasse um bocado de Clifford D. Simak, Eleanor Arnason, Harry Turtledove e, em menor escala, Philip José Farmer, Poul Anderson e Frederik Pohl.  Também conversamos bastante sobre os romances da Ursula K. Le Guin, sobretudo A Mão Esquerda da Escuridão; Os Despossuídos; O Planeta do Exílio; e A Cidade das Ilusões.  Após comentar que prefere ler as narrativas dos autores anglo-saxões em seu idioma original, Stella criticou a tradução do título do The Dispossessed como Os Despossuídos.  Confessei que esse romance foi o principal fator que me incentivou a querer saber mais sobre o anarquismo.[1]
Também conversamos sobre as estratégias de sobrevivência na carreira de autor lusófono de literatura fantástica.  Thaís indagou se eu havia me sentido triste com o fim do Projeto Taikodom, questão que motivou a descrição detalhada sobre minha participação naquela empreitada.  Comentei também sobre meu projeto literário atual ao qual tenho me dedicado em termos de leituras e escritas nos últimos quatro meses.
Falei um pouco sobre a diferença entre narrativas sérias de história alternativa e aquilo que se convencionou chamar AH-Lite, mencionando o exemplo hilariante da trilogia Aquiliad de S.P. Somtow.  Também conversamos sobre as diferenças entre as histórias alternativas e as ficções alternativas, citando o romance Anno Dracula de Kim Newman como exemplo emblemático.
Ao fim da reunião, tiramos algumas dezenas de fotos para registrar o evento.  Em seguida, sorteei dois exemplares da antologia Como Era Gostosa a Minha Alienígena! (Ano-Luz, 2002); um exemplar de meu romance de ficção científica erótica A Guardiã da Memória (Draco, 2011) e um exemplar da antologia Super-Heróis (Draco, 2013), que organizei com Luiz Felipe Vasquez.
Os membros do núcleo carioca do Vórtice Fantástico me convidaram para participar das reuniões.  Honrado e satisfeito, aceitei prontamente, pois desde os tempos saudosos das reuniões mensais do segmento carioca do CLFC que não participava de uma discussão tão animada e proveitosa sobre ficção científica e literatura fantástica.  No último sábado de agosto discutiremos o romance O Planeta dos Macacos (1963), de Pierre Boulle, possivelmente comparando-o com as versões cinematográficas de Franklin Schaffner (1968) e Tim Burton (2001).  Como li esse livro há quase quatro décadas numa edição portuguesa, julguei melhor encomendar a edição brasileira lançada no século XXI para a releitura.

Sorteados da tarde.

Participantes - Thaís, Alberth, Stella, Renata, Eliseu, Daniel e GL-R.


Saindo da biblioteca, caminhamos os sete até a Central do Brasil.  Stella e eu embarcamos no metrô, enquanto os demais seguiram de ônibus para os seus respectivos bairros.
Em resumo: uma experiência marcante conhecer pessoas novas interessadas em ficção científica e literatura fantástica como um todo.  Sempre sonhei com clubes de leitura exclusivamente dedicados ao nosso gênero.  Agora eles existem e o núcleo de um deles está atuante na minha cidade.

Jardim Botânico, Rio de Janeiro, 25 de julho de 2015 (sábado).


Participantes:
Alberth Moreira
Daniel Faleiro
Eliseu Ferreira
Gerson Lodi-Ribeiro
Renata Aquino
Stella Rosemberg
Thaís Cavalcante





[1].  Em termos bem resumidos, o romance consiste numa utopia pragmática em que a anarquia posta em prática a nível planetário.  Considerado por muitos como a melhor obra de Le Guin.  O protagonista é um físico da sociedade anárquica que vai lecionar em mundo de economia capitalista do mesmo sistema estelar.

2 comentários:

  1. Ótimo encontro, muito bem relatado nesta crônica. Nesse dia aprofundei um prazer que era um tanto tímido, de ler autores nacionais. Não é só necessário, o prazer de ler autores que colocam os seus personagens em ambientes ou em cultura que também é a sua, torá na experiência completa.

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  2. Ótima crônica! Pena que não fui nesse encontro, mas li seu livro e adorei. Bjs Andreia www.mardevariedade.com

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