Lançamento Carioca de
Back in the
U.S.S.R. de
Fábio Fernandes
201909212359P7
— 21.624 D.V.
“Deus
está morto e nossas listas viverão para sempre!”
(Eduardo Torres, Sereníssimo Moderador das Listas do
CLFC)
Hoje se deu o
lançamento carioca do romance fix-up Back in the U.S.S.R. (Patuá, 2019)
do Fábio Fernandes, meu velho amigo desde a década de 1980 que está radicado em
Sampa há quase vinte anos. Ao longo
desse tempo todo, já li vários fragmentos, por assim dizer, desse mosaico complexo
e estou bastante curioso para adquirir uma visão geral do universo ficcional
que o Fábio criou para o conto “Para Nunca Mais Ter Medo”, publicado
originalmente na revista Dragão Brasil nº 11 em 1995. Analisei três desses fragmentos, inclusive o conto
supracitado, que inaugurou a ficção alternativa brasileira, e a noveleta epônima
do romance recém-lançado[1],
em meu Cenários de História Alternativa (edição do autor pela Amazon,
2019).
O evento
transcorreu entre 11h00 e 14h00 na livraria Beringela, situada no subsolo do
edifício Marquês de Herval, na Avenida Rio Branco nº 181, numa simpática loja em
frente à prestigiosa livraria Da Vinci. Aliás,
foi nessa mesma Beringela que lançamos vinte e um anos atrás, em plena Copa do
Mundo da França, a antologia Outras Copas, Outros Mundos (Ano-Luz,
1998), organizada por Marcello Simão Branco.
* *
*
Saí de casa
de ônibus, saltando na estação de metrô de Botafogo. Em vez de embarcar direto para o Centro,
precisei dar um pulo no Rio Sul para pegar um material que havia deixado no
posto de atendimento do IPTU, onde trabalho.
Caminhei a pé
da Voluntários da Pátria até o shopping como de costume. Porém, na volta, preferi usar o serviço gratuito
de ônibus que o Rio Sul disponibiliza para transportar seus clientes de e para
a estação de metrô Cardeal Arcoverde. Dali,
embarquei rumo à estação Carioca, bem próxima ao Marquês de Herval.
* *
*
Descendo a
rampa para a galeria no subsolo desse prédio, deparei-me com o próprio Fábio
Fernandes, meus velhíssimos amigos e colegas dinossauros da FCB, Bráulio
Tavares e José Fernandes, e meus meramente velhos amigos Daniel Russell Ribas, Jorge
Pereira, Ricardo França e Toinho Castro.
A sessão de
autógrafos corria a pleno vapor no fundo da galeria, junto à porta da Beringela. Após um bate-papo com o Ribas, o Jorge e o França,
tratei de entrar na livraria, adquirir meu exemplar, coligir o autógrafo do
autor e malocar o romance na mochila para garantir.
O Autor e sua Obra.
Zé Fernandes conta um caso...
Daniel Ribas, Ricardo França, Jorge Teixeira.
* *
*
Ao longo da sucessão
de bate-papos interessantíssimos que se deram ao longo dessa sessão de
autógrafos, travei contato com Renan Bernardo, um jovem autor que só conhecia
das mídias sociais. Quando lhe falei que
eu, Fábio, Zé e o Bráulio já éramos amigos há mais de trinta anos, ele comentou
que gostaria de conhecer um pouco mais sobre a história da ficção científica
brasileira e das pessoas que atuaram nesse gênero durante estas décadas. Falei-lhe que uma maneira de tentar
vislumbrar o que ocorreu na FCB daqueles tempos pré-internet era conversar com
as pessoas que fizeram parte do movimento (se é que podemos chamá-lo
assim). Outra maneira era ler as cópias
digitalizadas dos melhores fanzines da época, o Megalon e o Somnium,
esse último ainda existe e, embora com periodicidade irregular, é o veículo oficial
do Clube de Leitores de Ficção Científica desde o advento dessa agremiação. Por iniciativa de seu antigo editor, Marcello
Simão Branco, todos os Megalons se encontram disponíveis para
download. Já quanto aos Somnia não
se pode afirmar o mesmo.
Apresentei Ricardo
França ao Zé e ao Bráulio como “o irmão do Ícaro França”, que ambos já conhecem
há mais de trinta anos. Em conversa com
o Fábio e o Zé, ambos Fernandes, o segundo falou sobre a ocasião em que ele parabenizou
o amigo e correspondente (sim: histórias epistolares de dinossauros pré-internéticos!)
norte-americano John Stith pelo fato de o romance dele, Redshift Rendezvous
(Ace Books, 1990)[2]
ter sido publicado em Portugal pela Coleção Argonauta. Em sua carta seguinte, alguns meses mais tarde,
Stith agradeceu ao Zé, pois não sabia da publicação em português. Ato contínuo, demitiu seu agente literário
picareta. Percebam que naqueles tempos
pré-históricos, o tal agente julgava ter praticado o crime perfeito.
Eu, Jorge e França
conversamos sobre o estado de saúde de meu sogro, que foi professor de nós três
no Departamento de Engenharia Eletrônica da UFRJ no campus do Fundão. Então nos lembramos de um conhecido comum da Eletrônica,
Ricardo Rhomberg Martins, falecido na última quinta-feira, cujo funeral transcorreu
neste sábado.
GL-R, Fábio Fernandes, Zé Fernandes.
Jorge, Fábio, Zé, França.
Eduardo Torres, Fábio, Bráulio Tavares, Gabriel Tavares, Zé.
Fábio, GL-R, Bráulio.
Quando Renan
se uniu a nosso trio, resolvemos elevar o astral falando um pouco da edição brasileira
da Asimov’s, publicada por estas plagas entre meados de 1989 e janeiro
de 1993. Daí, para discorrer sobre os
autores e narrativas sensacionais que conhecemos graças à revista foi um pulo. Entre nossos contos e noveletas favoritos,
destacamos: “Os Blues do Planeta Vermelho” e “Terra que Treme” (Allen M. Steele);
“O Preço das Laranjas” e “Gente como a Gente” (Nancy Kress); a bela ficção histórica
“Piece de Resistance” (Judith Tarr); “Toda a Cerveja de Marte” (Gregory
Benford); “Pesadelos da Mente Clássica”, um dentre vários trabalhos
sensacionais do Charles Sheffield; “Mr. Boy” (James Patrick Kelly); “Por que Saí
do Harry’s 24 Horas” e sua continuação (Lawrence Watt-Evans); a bela fantasia “A
Linda Filha do Caçador de Escamas” (Lucius Shepard); “Fuga de Katmandu” e suas continuações
(Kim Stanley Robinson); “Dilema” e outras narrativas cômicas da Connie Willis; “Not
Fade Away” (assim mesmo, em inglês) do R. Garcia y Robertson; a novela de
golfinhos inteligentes, “Um Mar Mais Profundo” (Alexander Jablokov), mais tarde
expandido no romance homônimo A Deeper Sea (AvoNova, 1994)[3];
“O Mundo Flutuante” (Victor Milán); o belo e pungente “O Dom da Palavra” (Octavia
E. Butler); a novela “O Limite da Visão” (John Barnes), mais tarde expandida no
romance Sin of Origin (New English Library, 1991)[4];
o conto de FC “A Flor de Vidro” do George R.R. Martin; a história alternativa “Tudo
Menos a Honra” (George Alec Effinger); a noveleta “Bwana” e suas continuações (Mike
Resnick); o instigante “Ondulações do Mar de Dirac” (Geoffrey E. Landis); o
genial “Fidelidade” (Greg Egan), que me inspirou a escrever o conto “Coleira do
Amor”; a novela “Pequeno Tango” (Judith Moffett), um fragmento do romance The
Ragged World (Ballantine-Del Rey, 1992)[5])
et cetera.
* *
*
Quando Eduardo
Torres e Osmarco Valladão chegaram, o teor das conversas mudou um pouco, mas não
a qualidade. Osmarco e Eduardo
comentaram sobre o cotidiano, os incidentes e as experiências dos petroleiros
nas plataformas oceânicas brasileiras que inspiraram o saudoso Max Mallmann a
escrever os roteiros da primeira temporada da série da Globo, Ilha de Ferro
(2018). Ainda nessa linha, ambos rememoraram
o mistério do tatuí gigante, encontrado agarrado ao tubo da perfuratriz de uma
plataforma que, por algum tempo, chegou a ser confundido com uma criatura alienígena,
até ser impiedosamente cozido e degustado pelos petroleiros da plataforma,
antes mesmo que a ciência xenológica pudesse se pronunciar a respeito. Edu levantou a hipótese de que poderia se
tratar de um embaixador alienígena e que, o fato de ter sido devorado, qual um
Bispo Pero Fernandes Sardinha pelos caetés em 1552, poderia desencadear uma invasão
estelar ou, no mínimo, uma expedição punitiva do espaço exterior.
No entanto, há
fontes desmancha-prazeres que alegam que o tal emissário alienígena não passaria
de um espécime de crustáceo isópode gigante, o Bathynomus giganteus, que
habitaria as regiões profundas do oceano.
De fato, como o leitor pode conferir acima, o tal embaixador alienígena guarda
semelhanças notáveis com o isótope referido.
Para vocês verem: a Crônicas da Ficção Científica Carioca também é
cultura. Cultura criptozoológica, no
caso.
Bathynomus giganteus, vulgo emissário isópode alienígena.
Osmarco Valladão, Jorge, França e Edu.
Osmarco também
comentou sobre o nível de detalhamento fantástico dos cenários dos jogos
modernos de ficção científica. Já Edu Torres
admoestou os sócios do CLFC que ainda não votaram na eleição presidencial para
o biênio 2019-2021, para que o façam antes que o prazo se encerre. Pela primeira vez na história do clube, há duas
chapas concorrentes. Em todos os
certames anteriores, a chapa única que se voluntariou foi aclamada pelos associados. Eu e Edu reparamos que as duas listas de discussão
do CLFC do Yahoogroups estão em situação sui generis. Eu as criei na década de 1990, primeiro a
lista-do-CLFC e, alguns anos mais tarde, a sócios-do-CLFC. Quando assumi a presidência para o biênio de
1999-2001, transferi todos os poderes sobre as listas ao Edu, que desde então tem
exercido com sabedoria e serenidade o cargo de moderador das duas. Transferi todos os poderes, menos o poder de deletar
a lista, pois esse é intransferível. Acontece
que o e-mail que me identificava como criador das listas foi descontinuado pela
empresa há três ou quatro anos. Daí, o Criador
está morto e ninguém mais pode deletar as listas. Ou, pelo menos, nenhum humano orgânico... Nossas listas adquiriram, senão imortalidade,
ao menos, certa invulnerabilidade à deleção indevida.
Infelizmente,
tudo o que é bom cedo ou tarde acaba. Por
volta das 14h00, o pessoal da Beringela começou a se movimentar para cerrar as
portas. Encurralados, empreendemos uma retirada
bem coordenada rampa acima até a Rio Branco, em cuja calçada ainda ficamos de
papo por alguns minutos. A galera estava
tentando se articular para um almoço ali pelo Centro mesmo, de repente, na Cinelândia. Como estava meio cansado, declinei do planejamento
e segui em direção à entrada da estação Carioca.
Quinze minutos
mais tarde, saltava na estação Botafogo.
Dali tomei o ônibus de integração do metrô e, vinte minutos depois,
chegava em casa sem maiores incidentes. Leitura
de bordo: Sapiens: uma breve história da humanidade (L&PM, 2015), do
Yuval Noah Harari.
Jardim Botânico, Rio de Janeiro, 21 de setembro de 2019 (sábado).
Participantes:
Bráulio Tavares.
Daniel Russell
Ribas.
Eduardo Torres.
Fábio Fernandes.
Gabriel Tavares.
Gerson Lodi-Ribeiro.
Jorge Gervásio Pereira.
José dos Santos Fernandes.
Osmarco Valladão.
Renan Bernardo.
Ricardo França.
Toinho Castro.
[1]. Publicada originalmente
no Megalon 46 (outubro de 1997). Republicada
pela editora Draco como e-book em 2013.
[2]. Nanorresenha extraída
do meu bunker de dados: Redshift Rendezvous (1990) – Experiências e
aventuras do imediato da Redshift, uma nave mercante que viaja pela
camada dez do hiperespaço, conduzindo carga e passageiros de um sistema estelar
para o seguinte. A coisa começa a esquentar quando uma passageira decide se
suicidar e um tripulante desaparece. A
espaçonave é sequestrada por uma quadrilha interessada em saquear os tesouros
de um planeta secreto que é a sede de uma religião. De longe, o melhor do romance é a descrição
soberba dos efeitos relativísticos presentes no ambiente hiperespacial, onde a
velocidade da luz é de apenas 10 metros por segundo... Se não grandioso é, ao menos, instigante e divertido.
[3]. Outra nano: A
Deeper Sea (1994) – Coronel russo força golfinhos a se comunicar com a
humanidade e os utiliza como arma de guerra contra o Japão e os EUA em batalhas
navais no Pacífico do início do século XXI.
Considerado criminoso de guerra por ter torturado uma outra espécie racional,
é absolvido graças à intervenção de seus ex-comandados. Mais tarde, ele lidera uma expedição
humano-cetácea ao sistema jupiteriano na tentativa de estabelecer contato com
criaturas inteligentes que habitam o gigante gasoso.
[4]. E mais outra: Sin
of Origin (1991) – Ficção científica hard de cunho xenológico e religioso. Em futuro remoto, numa periferia galáctica dividida
entre as esferas de influência da Cristandade, do Islã e do Comunismo, monges
da ordem de São Tomás de Aquino descobrem no planeta Randall uma biosfera
habitada por três espécies inteligentes: os humanoides de quatro braços
chamados randallianos; os centauroides alados grifos e os serpentiformes
do Povo Silencioso. Com o planeta
ameaçado por cruzada de extermínio levada avante pela ordem dos Templários, o
xenologista Frade Hauskyld Gomez tenta chegar a termos com a cultura autóctone
das três espécies, com o propósito de compreendê-la para então salvá-la, tanto
pela fé e o conhecimento de Cristo, quanto das armas nucleares dos Templários. Para tanto, o frade xenólogo é auxiliado por
Clio Yeremenko, uma xenologista que chegou a Randall como clandestina, oriunda
de Marte, mundo integrante da Liga Comunista, e que se torna a única mulher do
planeta. A primeira narrativa ocupa mais
da metade do livro e conta a guerra movida pelos Altos-Reis contra o posto
avançado humano e da conversão dos autóctones e do martírio do primeiro santo randalliano. A segunda narrativa se passa onze anos mais
tarde, e fala da luta condenada ao fracasso das Tríades tradicionalistas contra
o poder tecnológico dos párias randallianos e do estabelecimento do primeiro
bispado de Randall sob a égide de um grifo sábio. A terceira e última narrativa se passa uma
década após a segunda, e descreve a comissão, via teleporte sublúnico, do grifo
sábio tornado bispo no sistema-sede da Arquidiocese a que o planeta Randall
pertencia. FC hard xenológica em seu
melhor!
[5]. Prometo que será a última: The Ragged World (1992)
– Primeiro romance da trilogia Holly
Ground, de Judith Moffett, constituído pelo fix-up de contos,
noveletas e novelas publicadas entre 1988 e 1990, acrescido de material
inédito. À beira do holocausto ecológico
global no início do século XXI, humanidade trava contato com os Hefn e os Gafr,
espécie alienígena geminada que havia exilado alguns cidadãos na Terra do
século XVIII. Moffett pungente,
pertinente e original.
Muito legal ver as fotos com Braulio, Zé Fernandez, Eduardo Torres e Fábio Fernandes... Nostalgia total. O Gerson tá ficando a cara do Alfredo Sirkis. O livro lançado eu já li, tendo adquirido no lançamento aqui em São Paulo. A ser comentado oportunamente no meu blog.
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